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quarta-feira, 19 de maio de 2010

Heartache


Saboreava cada dia como um fruto suculento - o prazer do sumo a escorrer pelo queixo após a mordidela. A língua a traçar o contorno dos lábios, sedenta de mais uma gota de néctar. Os olhos ricos de um brilho sideral.

O corpo dormente a cada brisa que trazia o teu perfume. A cada movimento teu. O coração cavalgava a cada dia. Havia uma espécie de razão para o fazer mais depressa.

Havia um pretexto plenamente justificável para não ligar puto ao que o meu professor de ciências estava a dizer, não pelo simples facto de ser uma bela adormecida mas porque a cada momento a janela do corredor podia-me surpreender com uma visão tua. Eu amava essas surpresas que a janela me fazia.

Todas as aulas, durante todo o carvão gasto a riscar a casta mesa, a impaciência pela derradeira sinfonia de liberdade percorria todo o meu corpo, desde os cabelos até aos dedos que traçavam coisas indecifráveis (para os outros) mas tão significantes para os meus olhos.

Sentia-me como que aconchegada com o olhar quase protector que fugia pelo vidro, numa das tuas visitas a nenhures. Talvez fosse mera curiosidade da tua parte, não interessa. Quando pressentia o teu meio indiferente caminhar pelo corredor, as tuas sucessivas idas e vindas com pretextos comuns, era das únicas alturas em que as minhas íris se encontravam com as do professor. Fazia-me indiferente, tal como tu te fazias quando, incalculadamente, os nossos olhos se encontravam. Era desconfortável, virávamos instintivamente os rostos para o vazio e eu continuava a minha espera, recomeçando a rabiscar réplicas de sentimentos para a mesa.

Bem, eram uma escapatória, esses olhares furtivos.

E, finalmente, TRI-RRIM-RI...

À mínima ressonância do tão adorado toque só qu...

.... STOP.

Não me quero lembrar de mais nada. Eu devia saber, eu devia, juro que devia. Eu devia ter sabido logo da possibilidade das dores cruciantes que assombram o coração quando nos entregamos demasiado.

Melhor, eu sabia. Eu sabia, eu sabia que havia uma íínfima possibilidade, que estava bem lá no fundo, que não acontecia em todos o casos. Que ia tudo correr bem, afinal porque não experimentar?

Estúpida, estúpida, estúpida.

Eu devia saber logo que te ia amar, que ia sofrer, que mais tarde ia desejar por entre o sangue a escorrer dos lábios cravados pelos dentes e de pálpebras juntas e húmidas, nunca ter acontecido nada.

Por um lado arrependo-me tanto. Por outro...

... o que teria sido de mim se não tivesse provado pela primeira vez uma dor de coração? Mesmo que tenha sido por minha culpa?

Posso dizer que estou curada.

Mas aquela dor... eu devia ter sabido. Quase todos os apaixonados a têm.

19 de Janeiro de 2010

Vodka Limão

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