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domingo, 30 de maio de 2010

Amiga Morte


Quando estiver na idade acabada, quando só for eu e a minha acabada casa, quando já ninguém me conhecer, quando nem um olá me dirigirem, quando já nem se quer me vierem visitar, quando nem os gatos, nem os cães, nem nenhum animal qualquer se importar de me fazer companhia, quando já for esquecida, só irei conseguir ver através destes olhos já meios cansados duma vida, uma única solução.
A única verdadeira amiga, a que nunca me largou em qualquer momento, a única que nunca me desiludiu e podia acabar com a minha dor, que podia acabar com tudo, foste só TU. Olá minha amiga Morte, vem e acaba com tudo isto, com todo este sentimento, com este esquecimento, acaba com esta velha que foi abandonada pelo mundo.

Vodka Morango

Semi-frio

Vocês os dois... Voltaram a assaltar a minha memória. Que jeito é esse o vosso de entrar de mansinho na minha quietude?
A um eu já me habituei. Vem quase todos os dias e já faz parte. já tem quase uma presença trivial. E não me deve nada. Se vem é porque pouco me esforço para o não deixar entrar.
Já o outro... porquê? Porquê tudo isto? Serei assim tão insignificante para o semi-frio do teu coração? Um semi-frio invertido: primeiro vem o gelo, uma glacialidade quase inquebrável. Corajoso aquele que morde essa casca arrepiante do teu coração para depois provar o calor do seu interior, esse veludo puro que infelizmente tentas esconder.
Se calhar nem é preciso ser-se muito corajoso. É preciso ser-se paciente.
Eu nem sempre o sou. E, vês? Alcancei a brandura que trazes dentro.
Sinto falta do teu abraço.

Será assim tão difícil compreenderes isto?
Deixa de cravar esse punhal de indiferença. Mesmo que para isso tenhas de libertar o grito que conservas. Não o escondas. Não o escondas.

Eu não me importo.

Vodka Limão

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Heartache


Saboreava cada dia como um fruto suculento - o prazer do sumo a escorrer pelo queixo após a mordidela. A língua a traçar o contorno dos lábios, sedenta de mais uma gota de néctar. Os olhos ricos de um brilho sideral.

O corpo dormente a cada brisa que trazia o teu perfume. A cada movimento teu. O coração cavalgava a cada dia. Havia uma espécie de razão para o fazer mais depressa.

Havia um pretexto plenamente justificável para não ligar puto ao que o meu professor de ciências estava a dizer, não pelo simples facto de ser uma bela adormecida mas porque a cada momento a janela do corredor podia-me surpreender com uma visão tua. Eu amava essas surpresas que a janela me fazia.

Todas as aulas, durante todo o carvão gasto a riscar a casta mesa, a impaciência pela derradeira sinfonia de liberdade percorria todo o meu corpo, desde os cabelos até aos dedos que traçavam coisas indecifráveis (para os outros) mas tão significantes para os meus olhos.

Sentia-me como que aconchegada com o olhar quase protector que fugia pelo vidro, numa das tuas visitas a nenhures. Talvez fosse mera curiosidade da tua parte, não interessa. Quando pressentia o teu meio indiferente caminhar pelo corredor, as tuas sucessivas idas e vindas com pretextos comuns, era das únicas alturas em que as minhas íris se encontravam com as do professor. Fazia-me indiferente, tal como tu te fazias quando, incalculadamente, os nossos olhos se encontravam. Era desconfortável, virávamos instintivamente os rostos para o vazio e eu continuava a minha espera, recomeçando a rabiscar réplicas de sentimentos para a mesa.

Bem, eram uma escapatória, esses olhares furtivos.

E, finalmente, TRI-RRIM-RI...

À mínima ressonância do tão adorado toque só qu...

.... STOP.

Não me quero lembrar de mais nada. Eu devia saber, eu devia, juro que devia. Eu devia ter sabido logo da possibilidade das dores cruciantes que assombram o coração quando nos entregamos demasiado.

Melhor, eu sabia. Eu sabia, eu sabia que havia uma íínfima possibilidade, que estava bem lá no fundo, que não acontecia em todos o casos. Que ia tudo correr bem, afinal porque não experimentar?

Estúpida, estúpida, estúpida.

Eu devia saber logo que te ia amar, que ia sofrer, que mais tarde ia desejar por entre o sangue a escorrer dos lábios cravados pelos dentes e de pálpebras juntas e húmidas, nunca ter acontecido nada.

Por um lado arrependo-me tanto. Por outro...

... o que teria sido de mim se não tivesse provado pela primeira vez uma dor de coração? Mesmo que tenha sido por minha culpa?

Posso dizer que estou curada.

Mas aquela dor... eu devia ter sabido. Quase todos os apaixonados a têm.

19 de Janeiro de 2010

Vodka Limão

terça-feira, 18 de maio de 2010

Vem


Vem.

Inquietavam-se os galhos das árvores quando ele caminhou na minha direcção.

Estava escuro, o frio entranhava-se na minha pele e os cabelos acariciavam o vento da noite.

O medo começava a invadir o meu corpo. Mas eu colhia máscaras na ansiedade para afastar esse inoportuno nervosismo.

Vem.

O tapete natural no chão da floresta crepitava a cada passo dele.

Mantinha o rosto perfeito longe do meu. Não me olhava nos olhos - mantinha-os presos nas folhas que estalavam sobre os seus passos.

Estaria a esconder-me algumas lágrimas que lhe fugiam do controlo?

Vem

Ele vinha.

Quase parei de respirar quando o seu aroma tão característico me preencheu os sentidos.

Fechei os olhos. E ouvi o meu coração bater mais rápido do que as asas de qualquer beija-flor.

Vem.

Respirei fundo e, o mais serenamente possível, manti as pálpebras juntas.

Senti-o tão próximo de mim que deixei de ouvir os sons das árvores em nosso redor. Só havia o frio e o medo. E o vento a sussurrar-me alento ao ouvido.

Tremi quando os seus dedos tocaram a pele do meu rosto e o obrigaram a olhá-lo. Afinal não era ele que queria evitar o meu olhar? Continuei com os olhos fechados.

O mundo, por instantes, parou.

As nossas respirações uniram-se. E, entretanto, o frio fugira, pela noite.

9 de Janeiro de 2010

Vodka Limão

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Miragem
















Para mim, neste momento, já és quase uma miragem.

Bem, quase.

À noite, quando me enrolo no edredon e me embrenho da escuridão ponteada pela luz ténue que foge pela janela com as persianas meias fechadas do meu quarto, quando vejo os teus lábios tocar na pele dos meu pulsos, ou ouço um suspiro teu ao ouvido... és uma miragem tão real.

Mas, depois do toque do despertador, logo pela manhã, desvaneces.

Acordo lentamente, resmungo para o nada, escolho a roupa que vou vestir, tomo o leite com cereais, ponho perfume nos pulsos, aperto o relógio que me lembra os minutos (monótonos) que passam, escovo os dentes, levo mais uma vez a música aos ouvidos, visto um casaco qualquer e corro para mais um dia igual aos outros.

Arranco um sorriso dos confins da minha alma e arrasto-me com os livros na mão, pelos corredores, à procura da sala para a próxima aula. Tenho conversas. Encontro-me com aqueles que realmente me importam, que eu amo e se preocupam comigo. Sinto falta de outros que estão longe.

Às vezes, atiro-me para um canto com os phones nos ouvidos. Rabisco nas mãos coisas indecifráveis ao olhar de alguém que não eu. Leio e ouço coisas que me tocam na ferida.

Sabes, eu pensava que andava a enganar completamente a mim própria.

Mas não, é exactamente o contrário. Quando alguma pessoa mais corajosa me fala de ti, costumo despejar algo que não o que realmente sinto.

Mas também, admito, não estou a ser honesta comigo mesma. Pelo menos, não dessa forma.

Passo por ti. Indiferente, despreocupado, distante, alterado. Como se nunca na vida tivesses pronunciado o meu nome ou mergulhado no meu olhar.

Irreconheço-te. E percebo que o meu amor por ti é uma miragem ainda mais miragem do que a miragem que me beija antes de adormecer. Bem, quase.

Irreconheço-me também a mim própria.

E, no meio de tudo isto, chego a pensar que eu - o meu amor (por ti) - é que é a verdadeira miragem.

Virei a página.

Ou, vá, quase.

P.S.: Peço desculpa pela má qualidade do texto que se seguiu e ainda mais caso se sintam desiludidos por terem perdido uns minutos do vosso tempo a ler isto. Este texto pode até nem ter mesmo sentido, mas na altura em que o escrevi estava com vontade de deitar para cá para fora assim umas coisas do género. Aviso, também, que é mais ou menos fictício. Este texto foi escrito a 19 de Janeiro deste ano.

Oh, and I'm sorry, again.

Vodka Limão

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Era uma menina bonita ..

Os olhos fixavam-se em mim, parecia que me estavam a ler a mente. Um barulho ensurdecedor preencheu aquela sala vazia aterradora, mas logo de seguida um vulto foi-se aproximando de mim, e eu não entendia o que se passava, mas não temia qualquer acto possivel que me pudessem fazer, ser-me-ia completamente indiferente, já nada havia a temer. Num silêncio perturbador suavam vozes de vários tons. Não, relamente não sabia onde me havia metido, no entanto deixei-me ficar. Um movimento repentino e brusco foi a causa da minha súbita morte. Só senti um braço trespaçar-me o corpo e arrancar-me o coração, como se estivesse a actuar normalmente. Talvez para ele fosse normal, mas para mim, para mim não era, mas mesmo assim continuei ali, sem vacilar. Sem medo, ali, impávida e serena, caí como se de uma pedra atirada se tratasse.

Vodka Morango