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domingo, 13 de dezembro de 2009

Healing is difficult, believe me.



Cheguei a casa e corri para a casa-de-banho.
Luz. Clareza. Espelho. Reflexo. Verdade.

Senti a minha mão tocar a pele do meu rosto, impávido. Vi, no espelho, uns olhos surpresos e desconhecidos. Apeteceu-me vomitar.
A minha mão tremia enquanto apalpava às cegas a gaveta branca mais próxima, em busca de uma tesoura. Quando os meus dedos trémulos alcançaram o metal frio, já algo lacrimal deslizava sobre a pele do rosto reflectido. O meu.
Agarrei um punho de madeixas e golpeei-o. Vi, sucessivamente, os meus dedos abrirem-se para o chão: caiam fios leves de cabelos, fragmentos de memória.

Parei quando me apercebi que cortar o cabelo ia dilacerar a cortina que me poderia cobrir o rosto (desconhecido), o rosto que queria que fosse desconhecido, o rosto que não queria mais ver. Uma espécie de protecção.

Mudei de táctica.

Atirei tudo o que me deste contra o fundo de uma gaveta, como se faz aos medos. Não quis olhar mais para ela.
Deixei de ouvir aquelas músicas que tu gostavas mas não as apaguei (ouvia-as, por vezes, quando não aguentava mais e me queria aproximar de ti)
Aquela roupa... daquele dia... escondi-a.
Mudei a cor do cabelo, clareei-o, fiz com que os reflexos sobressaíssem.
Escondi o verniz, aquele verniz e os anéis que, naquela altura, ornamentavam as mãos que gostavas de explorar - foram-se.
Mudei de carteira, de calças, de sapatilhas.
Comecei a usar outra maquilhagem, se é que dantes usava, sequer.
Quando pressentia a tua presença (sim, é fácil pressenti-la, só o teu aroma tão característico me acelerava o coração) deixava as madeixas do cabelo cobrirem-me o rosto. Não queria que me olhasses nos olhos.

Não interessava. Só não queria que ainda visses em mim a mesma rapariga que gostaste. Que amaste mesmo quando parecia que mais nada valia a pena.
Era tudo muito bom se realmente fosse capaz de o fazer.
Eu queria mudar para esquecer.
Queria mudar.
O mais incrível é que ia mudando inconscientemente. Não havia data marcada ou plano definido. Foi acontecendo, a dor inconsciente que guardava no peito dava força aos meus movimentos. Se é que mudava.

Desde que não voltasse a deparar-me com algo daquela altura, tanto melhor. Mas era impossível apagar fosse o que fosse mudar radicalmente. Era covarde, limitava-me a esconder as coisas, a fugir do problema em vez de o enfrentar.

Arrancava a mim própria um sorriso, diariamente. Escondia (mais uma vez) a dor.

Talvez, afinal, não quisesse assim tanto mudar. Por que é que não queria? Incógnita.

Quero deixar de apagar esconder memórias.
Já me irreconheço. E a ti, cada vez mais.


Vodka Limão

3 comentários:

Isabel disse...

mais vale libertar a dor do que esconder...

beijinho

Vodka Limão e Vodka Morango disse...

claro, é verdade.

Pedro Pereira disse...

tanta nostalgia que por aqui paira.. experimentem beber vodka para esquecer. e depois, em pleno delírio febril, soltem aquilo que ainda restar do que esqueceram xD