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segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Sombras e Espectros (Parte I)

“Tudo se tornava cinzento, tudo ficava estático, nunca vi uma cidade tão vazia, tão morta. Será que também estarei morta? Fantasmas do passado voltavam a povoar a minha mente, e teimavam em não desaparecer. Cada vez mais vejo todas as coisas a desaparecer, parecia que estava num filme, que tudo desaparece aos poucos. Mas não, não era um filme, muito menos um sonho, era realmente a vida real. Será que tudo desaparecera assim porque o devia ser? Porque merecia ficar sozinha? Não podia ser, não podia ficar envolvida naqueles fantasmas, não podia morrer rodeada no passado! Eu merecia tanto como as outras pessoas ser feliz. Momentos, fotografias, músicas, tudo me vinha à memória. Desatei num choro sem fim, talvez inundaria aqueles fantasmas de raiva. E que iria ser de mim, ali sozinha, sem nada nem ninguém onde me pudesse apoiar para não cair? Onde estavam todos eles? Para onde tinham ido? Andava numa corrida desenfreada à procura de todos, mas nenhuma alma se encontrava naquela cidade escura. Gritei com toda a minha força, gritei até ficar sem voz, até não conseguir mais, mas nem isso foi capaz de me ajudar, até o meu sufocado grito foi em vão, afinal estava mesmo perdida naquele lugar aterrador, completamente sozinha. Sentei-me num canto à espera do impossível, esperei horas afio, mas nada se moveu. Por fim, comecei a ouvir vozes, que me transmitiam um certo medo. Seriam as vozes dos fantasmas do passado que voltavam mais fortes que nunca, pois estava eu ali, vulnerável e incapaz de tentar sequer lutar contra todos eles? As vozes cada vez mais próximas de mim, cada vez as ouvia mais intensas. Percebera então que chamavam por mim, que queriam que as seguisse para um lugar indeterminado. Por fim deparo-me com uma criança, toda ela pálida, toda ela completamente sem vida, mas mesmo assim transbordava uma beleza infinita. Naqueles tons acinzentados, ela continuava a ser a mais bela criança que já vira, apesar da tristeza cravada na sua cara, tinha uns lábios e uns olhos que de todo eram os mais carinhosos. Passado algum tempo de a estar a observar afincadamente, aqueles lábios bem desenhados começaram a mexer-se, num movimento rápido. Quereria ela dizer-me algo, mas aquela tristeza toda não a deixava pronunciar nenhuma palavra? Seria algo de importante? Preferi esperar para saber o que a rapariga me tentava contar com tanta pressa, mas nada saiu. Senti-me de novo perdida. Então, a criança agarrou a minha mão, puxou-me para perto de uma mulher, também ela com uma expressão melancólica e o seu olhar ainda mais triste que o meu. Perguntei-lhe para onde me levava, responderam-me num tom quase inaudível e com um riso sarcástico, que me levavam para o berço da morte, que iria confrontar todos os medos, todas as memórias do passado, todas as más recordações, ia ter de reviver a minha vida toda de novo. Tentei largar a mão da rapariga, mas tais forças não me ajudaram, tentei correr contra o tempo, mas esse já não existia mais ali. Até que por fim havíamos chegado às mortais portas. Concebiam-me um último favor antes de morrer. Demorei a responder, mas por fim soltou-se no meio de tanta solidão uma única palavra, “TU”. Apareces-te, como se de um anjo trata-se. Agarrei-te e permaneci ali imóvel, a chorar, sem forças para proferir quaisquer que fossem as palavras. Desejei que nada fosse verdade, mas parecia que não havia solução, sem serem aquelas derradeiras portas. Ficas-te ali, abraçado a mim, não me largas-te, até que o momento tivera terminado…”



Vodka Morango

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